Os mercados populares do Rio de Janeiro serão o tema do Carnaval da Estácio de Sá em 2018. Saara, Cadeg e o Mercadão de Madureira substituirão Singapura na Marquês de Sapucaí no enredo cujo título é: NO PREGÃO DA FOLIA SOU COMERCIANTE DA ALEGRIA E COM A ESTÁCIO BOTO BANCA NA AVENIDA."Estamos completando 90 anos e o que temos para “trocar” com o público é a nossa alegria", diz Tarcísio Zanon que assinará sozinho, pela primeira vez, o Carnaval da escola. O carnavalesco foi um dos responsáveis pelo título em 2014, quando a Estácio homenageou os 450 anos do Rio de Janeiro.
Como é arrebatador esse sol que brilha nessa terra maravilhosa dos encantos mil. E que bom rever minha São Sebastião do Rio de Janeiro tão próspera em atividade mercantil. Voltei de tempos passados à cidade que fundei para entrar na história que minha agremiação querida quer contar. Faço-me presente, com satisfação, para aplaudir minha escola a desfilar.
Sou o valoroso lusitano Estácio de Sá, vim de longe, de terras D’além mar. Meu grande feito foi daqui expulsar os franceses com o apoio dos índios aliados para essa linda cidade fundar. Parece absurdo, como podem portugueses unidos a indígenas guerrear? Ora, é simples explicar: para a confiança e a adesão dos nativos conquistar, foi preciso bugigangas da civilização lhes presentear.
Esse troca-troca do toma lá dá cá, do me dê me dá, muito encantou esses curiosos guerreiros, com muitos objetos, muito espelho. E foi assim que se aliaram à minha batalha, seguindo meu audacioso conselho. Por esse meio, aconteceu o primeiro escambo, desde que aqui nessas terras tropicais chegamos. Os índios levaram para suas aldeias o produto do primeiro comércio com os brancos e juntos comungamos. E com essa transação inicial, a fundação desse torrão carioca comemoramos.
Esse solo recém-achado teve suas riquezas extraídas para se comerciar em lugares distantes. Muito foi derrubado o pau-brasil por ser naquela época aqui abundante. Grandes carregamentos de especiarias ao velho mundo abasteciam. Saquearam tanto nosso solo sem nem considerar os que no futuro viriam.
Traficaram tudo, arrancando de seu berço africano até o negro rei, escravizado para o trabalho forçado nas lavouras da cana de açúcar e de café, para aos de pele alva servir. Máquinas humanas subjulgadas, adquiridas para a produção do refinado e da bebida quente, que uma desumana sociedade se abastava em consumir. Nesse período triste do cativeiro, escravos de ganho não libertos ganhavam dinheiro vendendo pelas ruas em bandejas diversos produtos. Usavam seu lucro para a compra da alforria em busca de um viver quase absoluto.
O comércio das ruas e praças do período colonial e imperial muito foi registrado em cores vivas pelo francês Debret. Pinturas que mostram o cotidiano dos vendedores ambulantes, retratos feitos com pinceladas de talento, admiráveis de se ver. De tudo vendiam esses primeiros camelôs: frutas, doces, salgados, sucos, aves, flores e tantos outros bibelôs.
De porta em porta, chegavam os mascates oferecendo suas quinquilharias. Para o caixeiro-viajante, seus artigos de venda para todos tinham alguma serventia. Com suas bugigangas e novidades da Corte, abasteciam os sonhos da população, dos fregueses conquistando a simpatia.
Explorando nosso chão território adentro, foram retiradas das minas toneladas de minerais. Seu escoamento para longe era comandado por oficiais das Gerais e de Goiás. O ouro e o diamante viraram para os lusos fonte de renda. Aqui garimpeiros, receptadores e negros livres negociavam metais valiosos e pedras preciosas por encomenda. Nessa cobiça de enricar e mudar de vida, alguns por vezes até sem escrúpulos se trucidando. Porém tudo que é desbastado em demasia um dia se finda, aos poucos a opulência da rica seiva do solo foi secando e dela ficou desprovida.
Os interesses comerciais mudam de acordo com a demanda do mercado. Sucedem-se ciclos econômicos para manter a lucratividade e o consumo da sociedade com certificado. No grande mercado brasileiro, tudo vira moeda de troca rentável. O tabaco, nesse contexto, já teve outrora no sertão seu valor, enviado para os europeus era especiaria bastante apreciável.
Na Praça Quinze, teve seus tempos áureos o Mercado Municipal, o maior entreposto de gêneros alimentícios da cidade no século passado. Desfigurado por um projeto de urbanização, do patrimônio histórico sobrou apenas uma torre da construção. Hoje em vez de comprar alimentos de todo sortimento, um restaurante especializado em frutos do mar se transformou para nosso degustamento.
A mão de obra que impulsionou nossa economia já foi do trabalho escravo do indígena e do negro e depois do trabalhador assalariado. Muito contribuíram os imigrantes com o desenvolvimento dessa nação, vieram de toda parte do mundo para integrar nosso primeiro proletariado. Além da presença remota da colônia portuguesa aqui, vieram outros estrangeiros aos milhares para no Brasil viver. Famílias inteiras ocuparam diversas regiões do país e trabalharam em vários setores para sobreviver. Esses trabalhadores de terras distantes arregaçaram as mangas e contribuíram bastante na construção da nossa pátria amada, verdadeiros comerciantes forasteiros veteranos, de competência considerada.
Quem nunca entrou nas quitandas e padarias do Seu Manoel? Nas pizzarias e cantinas das mamas de tirar o chapéu? Nos antigos turcos armarinhos? Nas lojas libanesas de tecidos no caminho? E quem nunca comeu um pastel com caldo de cana nas pastelarias chinesas por todos os bairros espalhadas? E ainda não provou os quitutes típicos dos refugiados sírios e angolanos em saborosas abocanhadas?
Nessa engrenagem, o comércio popular mantém a circulação do capital sempre a girar. É preciso pesquisar preço nos concorrentes para o minguado dinheiro ganho esticar. Nas feiras livres semanais, é de costume as madames barganharem o desconto dos hortigranjeiros fresquinhos. Nos essenciais supermercados, seções abastecem as necessidades da vida urbana com atraentes promoções que causam burburinho.
E o que dizer do garimpo de relíquias feito nos sebos, nos brechós e nos mercados de pulga que o boca a boca divulga? Na Lavradio, uma vez por mês são espalhadas barracas no asfalto que vira point cultural em busca do freguês. Vantajosos passeios na CADEG e na Feira de Tradições Nordestinas, com balanças pesando convidativas ofertas a quilo que favorecem nosso bolso já fazem parte da rotina. E o impressionante mundo de coisas acessíveis reunido no Mercadão de Madureira e no Saara, atendendo a todos os gostos de forma certeira! Mas para quem não quer sair de casa, a praticidade de comprar pelo computador, sinal dos tempos modernos que agrada ao consumidor.
Dessa forma fascinante, as mãos produtivas do comerciante na lida diária vamos exaltar. Reconhecendo a importância desse segmento na sociedade, com nossa medalha de ouro a eles vamos laurear.
Com a Estácio boto banca na Avenida, no pregão da folia para vender minha mercadoria. Tenho ouvido de mercador para atender a clientela, levando tudo por uma bagatela! Hoje tem fiado para quem pagar adiantado, pois quem manda é a freguesia!
No pague e pegue do carnaval, alegria e gente bamba com orgulho vamos exportar. Sem bravata e com felicidade no rosto, quero ver o gingado da mulata a comemorar! Estaciano eu sou de fato e rumo ao estrelato, o caneco quero levantar!
Referências bibliográficas:
- CASTRO & GIAMBIAGI & HERMANN, Lavínia, Fábio e Jennifer. Economia Brasileira Contemporânea. Rio de Janeiro: Editora Elsevier Brasil, 2011.
- ENDERS, Armelle. A História do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Gryphus, 2015.
- LEITÃO, Mércia Maria. Um Fotógrafo Diferente Chamado Debret. São Paulo: Editora do Brasil, 2015.
- LIMA, Gabriel. Comércio Eletrônico – Melhores práticas do mercado brasileiro. Rio de Janeiro: Editora ComSchool, 2015
- OLIVEIRA, Lucia Lippi. O Brasil dos Imigrantes. Coleção Descobrindo o Brasil. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2000.
- PIRES, Marcos. Economia Brasileira – Da Colônia ao Governo Lula. Rio de Janeiro: Editora Saraiva, 2014.
- SATO, Leny. Feira Livre – Organização, trabalho e sociabilidade. São Paulo: EDUSP, 2012.
- SENNA, Ernesto. O Velho Comércio do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Editora G. Ermakoff, 2006.
- VALBUZA, José Cláudio. Técnicas de Comercialização. Rio de Janeiro: Editora Saraiva, 2012.
SINOPSE
"NO PREGÃO DA FOLIA SOU COMERCIANTE DA ALEGRIA E COM A ESTÁCIO BOTO BANCA NA AVENIDA"Como é arrebatador esse sol que brilha nessa terra maravilhosa dos encantos mil. E que bom rever minha São Sebastião do Rio de Janeiro tão próspera em atividade mercantil. Voltei de tempos passados à cidade que fundei para entrar na história que minha agremiação querida quer contar. Faço-me presente, com satisfação, para aplaudir minha escola a desfilar.
Sou o valoroso lusitano Estácio de Sá, vim de longe, de terras D’além mar. Meu grande feito foi daqui expulsar os franceses com o apoio dos índios aliados para essa linda cidade fundar. Parece absurdo, como podem portugueses unidos a indígenas guerrear? Ora, é simples explicar: para a confiança e a adesão dos nativos conquistar, foi preciso bugigangas da civilização lhes presentear.
Esse troca-troca do toma lá dá cá, do me dê me dá, muito encantou esses curiosos guerreiros, com muitos objetos, muito espelho. E foi assim que se aliaram à minha batalha, seguindo meu audacioso conselho. Por esse meio, aconteceu o primeiro escambo, desde que aqui nessas terras tropicais chegamos. Os índios levaram para suas aldeias o produto do primeiro comércio com os brancos e juntos comungamos. E com essa transação inicial, a fundação desse torrão carioca comemoramos.
Esse solo recém-achado teve suas riquezas extraídas para se comerciar em lugares distantes. Muito foi derrubado o pau-brasil por ser naquela época aqui abundante. Grandes carregamentos de especiarias ao velho mundo abasteciam. Saquearam tanto nosso solo sem nem considerar os que no futuro viriam.
Traficaram tudo, arrancando de seu berço africano até o negro rei, escravizado para o trabalho forçado nas lavouras da cana de açúcar e de café, para aos de pele alva servir. Máquinas humanas subjulgadas, adquiridas para a produção do refinado e da bebida quente, que uma desumana sociedade se abastava em consumir. Nesse período triste do cativeiro, escravos de ganho não libertos ganhavam dinheiro vendendo pelas ruas em bandejas diversos produtos. Usavam seu lucro para a compra da alforria em busca de um viver quase absoluto.
O comércio das ruas e praças do período colonial e imperial muito foi registrado em cores vivas pelo francês Debret. Pinturas que mostram o cotidiano dos vendedores ambulantes, retratos feitos com pinceladas de talento, admiráveis de se ver. De tudo vendiam esses primeiros camelôs: frutas, doces, salgados, sucos, aves, flores e tantos outros bibelôs.
De porta em porta, chegavam os mascates oferecendo suas quinquilharias. Para o caixeiro-viajante, seus artigos de venda para todos tinham alguma serventia. Com suas bugigangas e novidades da Corte, abasteciam os sonhos da população, dos fregueses conquistando a simpatia.
Explorando nosso chão território adentro, foram retiradas das minas toneladas de minerais. Seu escoamento para longe era comandado por oficiais das Gerais e de Goiás. O ouro e o diamante viraram para os lusos fonte de renda. Aqui garimpeiros, receptadores e negros livres negociavam metais valiosos e pedras preciosas por encomenda. Nessa cobiça de enricar e mudar de vida, alguns por vezes até sem escrúpulos se trucidando. Porém tudo que é desbastado em demasia um dia se finda, aos poucos a opulência da rica seiva do solo foi secando e dela ficou desprovida.
Os interesses comerciais mudam de acordo com a demanda do mercado. Sucedem-se ciclos econômicos para manter a lucratividade e o consumo da sociedade com certificado. No grande mercado brasileiro, tudo vira moeda de troca rentável. O tabaco, nesse contexto, já teve outrora no sertão seu valor, enviado para os europeus era especiaria bastante apreciável.
Na Praça Quinze, teve seus tempos áureos o Mercado Municipal, o maior entreposto de gêneros alimentícios da cidade no século passado. Desfigurado por um projeto de urbanização, do patrimônio histórico sobrou apenas uma torre da construção. Hoje em vez de comprar alimentos de todo sortimento, um restaurante especializado em frutos do mar se transformou para nosso degustamento.
A mão de obra que impulsionou nossa economia já foi do trabalho escravo do indígena e do negro e depois do trabalhador assalariado. Muito contribuíram os imigrantes com o desenvolvimento dessa nação, vieram de toda parte do mundo para integrar nosso primeiro proletariado. Além da presença remota da colônia portuguesa aqui, vieram outros estrangeiros aos milhares para no Brasil viver. Famílias inteiras ocuparam diversas regiões do país e trabalharam em vários setores para sobreviver. Esses trabalhadores de terras distantes arregaçaram as mangas e contribuíram bastante na construção da nossa pátria amada, verdadeiros comerciantes forasteiros veteranos, de competência considerada.
Quem nunca entrou nas quitandas e padarias do Seu Manoel? Nas pizzarias e cantinas das mamas de tirar o chapéu? Nos antigos turcos armarinhos? Nas lojas libanesas de tecidos no caminho? E quem nunca comeu um pastel com caldo de cana nas pastelarias chinesas por todos os bairros espalhadas? E ainda não provou os quitutes típicos dos refugiados sírios e angolanos em saborosas abocanhadas?
Nessa engrenagem, o comércio popular mantém a circulação do capital sempre a girar. É preciso pesquisar preço nos concorrentes para o minguado dinheiro ganho esticar. Nas feiras livres semanais, é de costume as madames barganharem o desconto dos hortigranjeiros fresquinhos. Nos essenciais supermercados, seções abastecem as necessidades da vida urbana com atraentes promoções que causam burburinho.
E o que dizer do garimpo de relíquias feito nos sebos, nos brechós e nos mercados de pulga que o boca a boca divulga? Na Lavradio, uma vez por mês são espalhadas barracas no asfalto que vira point cultural em busca do freguês. Vantajosos passeios na CADEG e na Feira de Tradições Nordestinas, com balanças pesando convidativas ofertas a quilo que favorecem nosso bolso já fazem parte da rotina. E o impressionante mundo de coisas acessíveis reunido no Mercadão de Madureira e no Saara, atendendo a todos os gostos de forma certeira! Mas para quem não quer sair de casa, a praticidade de comprar pelo computador, sinal dos tempos modernos que agrada ao consumidor.
Dessa forma fascinante, as mãos produtivas do comerciante na lida diária vamos exaltar. Reconhecendo a importância desse segmento na sociedade, com nossa medalha de ouro a eles vamos laurear.
Com a Estácio boto banca na Avenida, no pregão da folia para vender minha mercadoria. Tenho ouvido de mercador para atender a clientela, levando tudo por uma bagatela! Hoje tem fiado para quem pagar adiantado, pois quem manda é a freguesia!
No pague e pegue do carnaval, alegria e gente bamba com orgulho vamos exportar. Sem bravata e com felicidade no rosto, quero ver o gingado da mulata a comemorar! Estaciano eu sou de fato e rumo ao estrelato, o caneco quero levantar!
Carnavalesco: Tarcisio Zanon
Autor da sinopse: Julio Cesar Farias
Referências bibliográficas:
- CASTRO & GIAMBIAGI & HERMANN, Lavínia, Fábio e Jennifer. Economia Brasileira Contemporânea. Rio de Janeiro: Editora Elsevier Brasil, 2011.
- ENDERS, Armelle. A História do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Gryphus, 2015.
- LEITÃO, Mércia Maria. Um Fotógrafo Diferente Chamado Debret. São Paulo: Editora do Brasil, 2015.
- LIMA, Gabriel. Comércio Eletrônico – Melhores práticas do mercado brasileiro. Rio de Janeiro: Editora ComSchool, 2015
- OLIVEIRA, Lucia Lippi. O Brasil dos Imigrantes. Coleção Descobrindo o Brasil. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2000.
- PIRES, Marcos. Economia Brasileira – Da Colônia ao Governo Lula. Rio de Janeiro: Editora Saraiva, 2014.
- SATO, Leny. Feira Livre – Organização, trabalho e sociabilidade. São Paulo: EDUSP, 2012.
- SENNA, Ernesto. O Velho Comércio do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Editora G. Ermakoff, 2006.
- VALBUZA, José Cláudio. Técnicas de Comercialização. Rio de Janeiro: Editora Saraiva, 2012.
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