Nos 60 anos do revolucionário desfile do Acadêmicos do Sagueiro, o colunista da Cadência da Bateria, Professor Mariano, analisa o retrocesso imposto pela atual gestão da Fundação Palmares que tenta retirar dos negros, sua participação como agente fomentador, transformador e constitutivo da história do Brasil. Confira o artigo do Professor:
Sessenta anos do Zumbi dos Palmares Salgueirense
e o negacionismo que toma conta da Fundação Palmares
por Professor Mariano
Neste ano completa-se 60 anos que o Grêmio Recreativo Escola de Samba Acadêmicos do Salgueiro descia o morro para desfilar na Avenida Rio Branco com o revolucionário enredo “Quilombo dos Palmares”. No dia 28 de fevereiro de 1960, ao assinar o enredo que narrava a saga do povo preto na luta contra a perversa escravidão, Fernando Pamplona e toda a comunidade salgueirense, dava também uma carta de alforria para o negro sambista falar da sua própria história e do seu povo. Pela primeira vez, o negro seria o protagonista de um enredo de uma escola de samba.
Neste ano completa-se 60 anos que o Grêmio Recreativo Escola de Samba Acadêmicos do Salgueiro descia o morro para desfilar na Avenida Rio Branco com o revolucionário enredo “Quilombo dos Palmares”. No dia 28 de fevereiro de 1960, ao assinar o enredo que narrava a saga do povo preto na luta contra a perversa escravidão, Fernando Pamplona e toda a comunidade salgueirense, dava também uma carta de alforria para o negro sambista falar da sua própria história e do seu povo. Pela primeira vez, o negro seria o protagonista de um enredo de uma escola de samba.
(foto: Revista Manchete - Edição Especial, março de 1960)
O Salgueiro contou de forma poética a épica história de resistência de Zumbi ou Zambi - grande líder do movimento de escravos que se recusou a aceitar a escravidão como condição de existência durante o Brasil colônia.
Ao falar dos quilombos como uma sociedade alternativa criada por escravos, os salgueirenses revolucionavam a narrativa do enredo de uma escola de samba que, até aquele momento, olhava para a história do Brasil valorizando mais os fatos gloriosos e vultos, ligados à realização e conquista dos homens da sociedade abastada, geralmente, brancos.
Fernando Pamplona valoriza, na sua inovadora narrativa, a história dos “de baixos”, e mais do que isso, diz para o componente do Salgueiro, na sua maioria negro descendente de escravo, que ele e seu povo têm uma linda história pela luta da liberdade. E que essa história não pertence somente aos negros, mas a todo o povo brasileiro, principalmente, à própria escola de samba. O que o carnavalesco fez serve de legado para as gerações futuras na luta por uma sociedade mais justa e uma história mais plural e ampla.
Sessenta anos depois do sucesso e consagração do enredo “Quilombo dos Palmares” do Salgueiro, que deu seu primeiro campeonato entre as grandes escolas do Carnaval carioca - junto a Portela, Mangueira, Império Serrano e Unidos da Capela, infelizmente a realidade do povo negro e pobre, de uma maneira geral, no Brasil pouco mudou em relação ao principal tema do enredo: a liberdade. As desigualdades sociais e econômicas no nosso país só se agravaram. O pobre continua preso na miséria da favela como nos tempos da luta contra o cativeiro social da escravidão.
E para agravar esse quadro de desalento para nós, negros e pobres do Brasil, temos na presidência da Fundação Palmares, instituição criada justamente para preservar a memória da luta do povo negro, narrada no antológico enredo do Salgueiro, Sérgio Camargo - um negro racista, nomeado pelo reacionário governo de Jair Bolsonaro. Camargo vem fazendo uma gestão que pode ser definida como um negacionismo tosco, que nega a participação do negro como sujeito da sua própria saga. Na sua incoerente gestão, Camargo vem tentando retirar do passado do negro, sua participação como agente fomentador, transformador e constitutivo da história do Brasil. Relega ao negro o papel de coadjuvante do seu próprio passado, como se via na ultrapassada historiografia positivista do século XIX. Ou seja, um retrocesso. Camargo constrói esse colossal recuo e ofende a memória dos quilombolas e seus líderes.
No exato momento em que celebramos os 60 anos da Revolução Salgueirense, quando a escola de samba passou a falar do seu próprio povo com orgulho e lirismo, nos deparamos com essa situação constrangedora: termos na presidência de uma fundação cultural negra, um negro que nega o protagonismo dos seus irmãos negros do passado na luta para acabar coma a maior chaga social da nossa história: a escravidão.
Eu, como intelectual negro, que na minha participação como escritor de enredos para o Carnaval da cidade de Niterói, sempre me preocupei em invocar e preservar a memória dos nossos ancestrais. Sinto-me muito incomodado com a presença desse cidadão à frente da Fundação Palmares. E, mais do que isso, me consterna também o silêncio que perdura no movimento negro e, especificamente, nas escolas de samba, em relação à presença e postura desse senhor na condução da agenda e pautas para as causas negras. Já passou da hora da comunidade e instituições de defesa do negro e da sua história, saírem da retaguarda e se posicionarem criticamente contra o desserviço de Sérgio Carmago à frente da Fundação Palmares à causa negra.
Zumbi dos Palmares, Luiz Gama, Luíza Mahin, Fernando Pamplona e tantos outros defensores da causa negra e de combate ao racismo estrutural brasileiro, clamam para que nós nos posicionemos criticamente contra a permanência de Sérgio Camargo na nossa Fundação Palmares.
Ao falar dos quilombos como uma sociedade alternativa criada por escravos, os salgueirenses revolucionavam a narrativa do enredo de uma escola de samba que, até aquele momento, olhava para a história do Brasil valorizando mais os fatos gloriosos e vultos, ligados à realização e conquista dos homens da sociedade abastada, geralmente, brancos.
Fernando Pamplona valoriza, na sua inovadora narrativa, a história dos “de baixos”, e mais do que isso, diz para o componente do Salgueiro, na sua maioria negro descendente de escravo, que ele e seu povo têm uma linda história pela luta da liberdade. E que essa história não pertence somente aos negros, mas a todo o povo brasileiro, principalmente, à própria escola de samba. O que o carnavalesco fez serve de legado para as gerações futuras na luta por uma sociedade mais justa e uma história mais plural e ampla.
Sessenta anos depois do sucesso e consagração do enredo “Quilombo dos Palmares” do Salgueiro, que deu seu primeiro campeonato entre as grandes escolas do Carnaval carioca - junto a Portela, Mangueira, Império Serrano e Unidos da Capela, infelizmente a realidade do povo negro e pobre, de uma maneira geral, no Brasil pouco mudou em relação ao principal tema do enredo: a liberdade. As desigualdades sociais e econômicas no nosso país só se agravaram. O pobre continua preso na miséria da favela como nos tempos da luta contra o cativeiro social da escravidão.
E para agravar esse quadro de desalento para nós, negros e pobres do Brasil, temos na presidência da Fundação Palmares, instituição criada justamente para preservar a memória da luta do povo negro, narrada no antológico enredo do Salgueiro, Sérgio Camargo - um negro racista, nomeado pelo reacionário governo de Jair Bolsonaro. Camargo vem fazendo uma gestão que pode ser definida como um negacionismo tosco, que nega a participação do negro como sujeito da sua própria saga. Na sua incoerente gestão, Camargo vem tentando retirar do passado do negro, sua participação como agente fomentador, transformador e constitutivo da história do Brasil. Relega ao negro o papel de coadjuvante do seu próprio passado, como se via na ultrapassada historiografia positivista do século XIX. Ou seja, um retrocesso. Camargo constrói esse colossal recuo e ofende a memória dos quilombolas e seus líderes.
No exato momento em que celebramos os 60 anos da Revolução Salgueirense, quando a escola de samba passou a falar do seu próprio povo com orgulho e lirismo, nos deparamos com essa situação constrangedora: termos na presidência de uma fundação cultural negra, um negro que nega o protagonismo dos seus irmãos negros do passado na luta para acabar coma a maior chaga social da nossa história: a escravidão.
Eu, como intelectual negro, que na minha participação como escritor de enredos para o Carnaval da cidade de Niterói, sempre me preocupei em invocar e preservar a memória dos nossos ancestrais. Sinto-me muito incomodado com a presença desse cidadão à frente da Fundação Palmares. E, mais do que isso, me consterna também o silêncio que perdura no movimento negro e, especificamente, nas escolas de samba, em relação à presença e postura desse senhor na condução da agenda e pautas para as causas negras. Já passou da hora da comunidade e instituições de defesa do negro e da sua história, saírem da retaguarda e se posicionarem criticamente contra o desserviço de Sérgio Carmago à frente da Fundação Palmares à causa negra.
Zumbi dos Palmares, Luiz Gama, Luíza Mahin, Fernando Pamplona e tantos outros defensores da causa negra e de combate ao racismo estrutural brasileiro, clamam para que nós nos posicionemos criticamente contra a permanência de Sérgio Camargo na nossa Fundação Palmares.
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PROFESSOR MARIANO
Historiador e pesquisador do carnaval, um dos fundadores do projeto Cadência da Bateria.
Em suas colunas aborda o carnaval considerando os aspectos políticos e sociais e a importância dos desfiles para a construção da memória da cultura popular.
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