Mangueira teu nome é o de todas as mulheres pretas que na luta se encontram!

segunda-feira, 22 de outubro de 2018 | 13h05
De volta à Cadência, o pesquisador André Gustavo exalta o sambaço da parceria encabeçada por Deivid Domênico que a Estação Primeira de Mangueira vai levar para a avenida em 2019

Mangueira teu nome é o de todas as mulheres pretas que na luta se encontram!
por André Gustavo

O belíssimo samba enredo composto por Deivid Domênico e cia foi o escolhido pela diretoria da escola como hino oficial para 2019. E tem tudo para fazer literalmente História, se convertendo no samba do ano e, quem sabe, conseguindo produzir o mesmo impacto que o da Tuiuti no último carnaval, que conquistou corações e mentes dos apaixonados pelo carnaval das escolas.

Mangueira 2018. Squel. Porta Bandeira (foto Raphael David | Riotur)

O samba, lindo em sua estrutura poética, com uma letra muito bem construída pela parceria e uma linha melódica encantadora, logo se destacou dentre a safra, tanto quanto, causou polêmica, pela citação que faz a vereadora Marielle Franco, brutal e covardemente assassinada em março deste ano. Tal polêmica ganhou contornos ainda mais trágicos com os tempos de intolerância que o país passou a viver, em especial ao longo do recente período pré eleitoral. E fora retroalimentada pelo resultado do primeiro turno das eleições, há uma semana atrás, cujo resultado alçou ao segundo turno um certo juiz com fama de linha dura e altamente conservador. A grande questão que se colocou a partir daí, e que alvoroçou a maioria dos mangueirenses que, tanto na quadra como nas redes sociais se fizeram apaixonados torcedores do referido samba durante dos meses em que se seguiu disputa, passou a ser a seguinte: O presidente da Mangueira, deputado estadual reeleito pelo mesmo partido do tal juiz que disputará o segundo turno das eleições para o governo do estado, sofreria pressão de seus correligionários para que a escola não escolhesse o samba concorrente que ousou exaltar a vereadora que, recentemente, tivera quebrada por dois sorridentes e cínicos brutamontes, uma placa em sua homenagem? Teria o candidato majoritário de seu partido, que por sua vez que encontrava-se presente no ato em que a placa da vereadora foi destruída (já ouvi relatos afirmando que ele estaria ao lado dos dois aloprados que cometeram tal atrocidade), influência suficiente sobre o presidente da escola, para tentar intervir, ainda que indiretamente, no resultado final da disputa, impedindo a escolha de um samba pela citação feita a uma antagonista, cuja memória tanto lhes assombra? E o presidente juntamente com sua diretoria? Seriam capazes de resistir a essas possíveis pressões?

As Respostas a todas essas preocupações viriam à tona, quando o presidente Chiquinho, altas horas da madrugada, fez o anúncio do samba campeão, transformando a angústia que tomava conta dos torcedores numa explosão de alegria e muito samba. A empolgante festa que tomou conta da comunidade, surpreendeu, sobretudo, por conta da disputa com outro samba o da dupla dos campeoníssimos Lequinho e Alemão do Cavaco, queridinhos da escola (diretoria e comunidade) e juntos novamente numa parceria (já haviam se unido e conquistado no ano passado), e que nos anos anteriores protagonizaram, rivalizaram e monopolizavam esta disputa, alternando-se como vitoriosos ora a parceria de um ora a do outro.

A vitória de uma nova parceria, que não conta com os compositores já consagrados e que se tornaram cartas marcadas na Manga, capaz de compor uma verdadeira obra prima (postulante a compor o rol dos grandes sambas da escola), contribui para dar uma oxigenada na ala dos compositores da verde e rosa e dar maior credibilidade a seu concurso de sambas enredo. Em todos os sentidos a diretoria da escola e todos os seus seguimentos estão de parabéns pelos sucessivos atos de coragem promovidos nesta madrugada. E, principalmente, pela audácia de dar voz as Marias, Mahins, Marielles, Malês.
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é pesquisador e apaixonado por samba e carnaval, a despeito de tudo!